domingo, 21 de junho de 2020

Quando um APF liga o Contador fica desconfiado

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Como já falei diversas vezes aqui, eu era lotado em uma delegacia que ficava em uma cidade no interior de um estado do nosso lindo Norte brasileiro. E, nessas cidades do interior, as pessoas se escondem sem querer se esconder de fato. Isso acontece por vários motivos: Por não declararem o imposto de renda, e com isso os bancos de dados ficam desatualizados. Por não terem acesso à tecnologia e redes sociais, dificultando essas buscas. Por morarem em sítios afastados que não pegam celular, não sendo possível achar os registros dessa forma também. Ou até mesmo por mudarem muito de casa, já que não tem uma propriedade residencial para chamar de sua, fazendo também que os nosso bancos de dados fiquem rapidamente defasados.

Esse tipo de situação dificulta demais de localizarmos essas pessoas quando se faz necessário. E quando existe uma ordem de encontrar e intimar, o chefe não aceita um simples "não achei" como resposta, a justiça também não. Se for para dar uma resposta dessas, o Agente Federal tem que ter feito uma busca minuciosa na cidade inteira, nos bancos de dados a que temos acesso, procurado em casa de parentes e amigos do "escondido", conversado com empregadores para quem a pessoa trabalhou, conversado com informantes. Talvez eu tenha esquecido algo, mas o delegado, bem como o promotor, na hora de mandar você procurar de novo, vai lembrar de algo que você esqueceu de fazer. Então, no final das contas, é bom você sempre achar.

E, por causa dessa exigência, que são exigências plenamente justificáveis, nós ficamos experts em achar pessoas, independentemente da sua furtividade (Queiroz que o diga). Podemos até não conseguir ir intimar, pois existem localidades que ficam a 3 dias de barco da cidade mais próxima, mas aí mandamos recado pelo barqueiro, e a pessoa aparece na delegacia para ser ouvida. Somos persistentes. Sempre seremos se quisermos fazer um bom trabalho. Não existe bom trabalho policial sem uma persistência do próprio policial. O crime raramente está exposto e fácil de encontrar. Ou você procura bem, com excelência, ou não encontra.

E numa dessas buscas incessantes que achei, buscando um empregador, o contador da empresa empregadora. Já havia procurado com pai, mãe, irmão, tio, tia, primos e a árvore genealógica toda. Ninguém tinha o contato ou o paradeiro. O que os familiares me informaram foi que não tinham o contato porque a pessoa aparentemente tinha ido morar em outra cidade e não deixou informações de seu paradeiro com eles (sim, apesar de inacreditável, isso acontece muito). Foi nessa hora que mudei o foco e fui atrás de onde ele teria trabalhado. Achei uma empresa nos bancos de dados. Mas eu simplesmente não conseguia falar com o responsável, então achei o contador e seu telefone. E foi para ele que eu resolvi ligar. A intenção era falar com ele para achar o telefone do dono da empresa, e verificar se ele sabia do paradeiro de quem eu procurava, se ainda trabalhava lá ou se pelo menos tinha o telefone.

Vou falar uma coisa para vocês, contador é um ser desconfiado. Não é por menos. A quantidade de maracutaia que eles fazem por conhecer as brechas da legislação contábil não está no gibi. Mas as grandes operações da Polícia Federal estão ai para mostrar que várias vezes o grande operador da grana eram os contatores das mega empresas corruptas. Normalmente esse é o profissional que envia a grana para o exterior, lava o dinheiro e o oculta quando é necessário. Então não é de se estranhar que ao receber uma ligação de um Agente da PF o cara tranque o cu.

Liguei, ele atendeu e me identifiquei. Obviamente ele desconfiou. Achou que era trote ou golpe. Tive que explicar a situação toda. Falei que não era nenhum problema com ele nem com a empresa a qual ele era responsável pela contabilidade. Que estava ligando para achar uma pessoa que possivelmente havia trabalhado lá e que eu precisava do contato do dono da empresa para tentar achar essa pessoa. Claro que se me liga um estranho se identificando como sendo Agente da PF e pedindo qualquer informação,  tendo a cabeça que eu tenho hoje, jamais forneceria nada. Não pela ligação ser da PF, por possivelmente não acreditar que de fato era alguém da Polícia ligando. Sendo assim acho que ele está totalmente correto em ser o mais desconfiado e prudente possível. Hoje estão fazendo de tudo para roubar informações e aplicar golpes via telefone.

Mesmo eu fornecendo vários dados que tínhamos sobre o ele, ele não acreditou. Tive que pedir para que ligasse na delegacia onde eu estava para que acreditasse. Desliguei o telefone. Cinco minutos depois recebo uma ligação do plantão: APF do Norte, ligação para você. Era o contador, agora um pouco mais calmo e crédulo. Ele tinha procurado o número de telefone da delegacia na internet para poder ligar, pois qualquer numero que eu fornecesse ele desconfiaria, afinal é exatamente assim que golpistas agem. Pediu desculpas pela desconfiança e justificou, falei que não tinha problema e que o entendia perfeitamente. Aí, finalmente, me passou o telefone de quem eu queria.

E vida que segue. Depois ele deve ter ido no banheiro se limpar. :P

ps.: Senhores e senhoras, agora eu também entrei na onda do Instagram. Lá estou sempre respondendo as suas perguntas, por mais capciosas que sejam. @apfdonorte Sigam lá.

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