domingo, 19 de julho de 2020

Um dia de merda: Histórias quando era PRF

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Minha intenção ao escrever aqui nesse espaço é contar histórias de dentro da polícia. Coisas dos bastidores que muitas vezes a população em geral não fica sabendo. Normalmente o que a mídia mostra é o lado glamouroso da PF e PRF. Mostra o resultado das operações, como elas deram resultados e os figurões que foram presos. Quase nunca mostram o quanto o policial teve que suar e, até muitas vezes, se quebrar para conseguir um resultado. As pessoas acostumadas a ver a polícia sempre ganhando, podem falar: "O APF do Norte só se fode! Só conta as coisas que não deram certo". Conto esses causos porque para uma ação dar certo, houve muitas antes que deram errado. Mas chega de conversa mole, e vamos para mais uma vez que quase deu merda.

A UOP (posto da PRF) onde eu trabalhava ficava numa estrada que ligava a capital a uma cidadezinha do interior, um trecho de cento e poucos quilômetros. E nessa cidadezinha havia uma festa anual, quando eles sempre chamavam para alegrar a festa, de forma gratuita, na praça central, uma atração nacional famosa. Então o fluxo de carros aumentava demais nesse trecho. E, por isso, a PRF era obrigada a chamar Policiais Rodoviários das outras regionais para ajudar na fiscalização. 

Nessa UOP, nos dias normais, ficavam apenas 3 policiais no plantão. Na época dessa festa na cidadezinha, o efetivo era de uns 20 policiais por plantão. Eu nunca tinha visto tanto PRF junto. Além do efetivo extra vindo de fora, nós, que já éramos lotados lá, tínhamos que fazer plantões extras para conseguir dar conta da fiscalização de tamanho fluxo de veículos.

Para vocês terem uma ideia, chutando por baixo, o fluxo aumentava umas 50 vezes. Talvez até mais. E por causa do aumento do efetivo de policiais na UOP, a PRF, para garantir que ninguém ficasse sem ter o que comer, acabava providenciando o almoço e a janta, já que os quiosques que ficavam próximos não teriam condição de atender esse aumento no número de pedidos de almoço e janta. Nesse dia eu não pude almoçar a comida que a PRF forneceu, pois no horário eu estava longe, no trecho, fiscalizando. Então eu comi um lanche qualquer e vida que segue. 

Quando estava na hora da janta, a banda que era a atração da festa parou na UOP e pediu nossa ajuda (era uma banda famosa). Eles estavam indo de Van da capital para a cidadezinha, e o engarrafamento na entrada da cidadezinha era grande. Então eles perguntaram se era possível escoltá-los para que conseguissem chegar à praça central. O chefe perguntou quem gostaria de ir, e eu fui um dos que voluntariei. Nunca tinha feito esse tipo de trabalho, queria experimentar.

Se não tivéssemos feito essa escolta a eles, eles não teriam conseguido chegar. A cidade estava lotada, tanto de carro quanto de gente. Tivemos que ir abrindo caminho e segurando o fluxo para conseguir chegar até o local. A escolta demorou umas 3h ou mais. Só sei que quando chegamos de volta na UOP a janta estava fria e fora da geladeira desde o almoço (guardem essa informação). Quase todo mundo já tinha jantando. Esquentei a minha marmita no micro-ondas e mandei pra dentro. Estava morto de fome. Só tinha comido aquela besteirinha na hora almoço e mais nada.

O plantão tem duração, normalmente, de 24h, e nesses dias de festa e aumento de fluxo o descanso só é possível após tudo acalmar. Então, após a janta, continuamos a fiscalização na BR até a madrugada. Eu não lembro ao certo a hora, mas as coisas finalmente se acalmaram. E após frenética fiscalização, os policiais finalmente puderam começar a se recolher para um merecido descanso. Esse descanso nós chamamos de "quarto de hora". funciona assim: enquanto uns descansam os outros ficam acordados para qualquer eventualidade, e depois invertem-se os papéis.

Uma observação:

Antes que falem que dormir no plantão é muita folga, fiquem sabendo que se houver um acidente na BR, que pode ter acontecido a mais de 300km de distância, o PRF obrigatoriamente tem que ir atender. Se ele estiver exausto, por causa disso, há a chance de se envolver também em um acidente. Então, nada justifica ficar todo mundo acordado sem fazer nada. Melhor descansar e guardar energia para o momento adequado.

Fim da observação.

Como a UOP era pequena e não tinha espaço para todo mundo, então havia muitos policiais dormindo em colchonetes, em sacos de dormir e até mesmo dentro das viaturas. Uns na sala, outros nos alojamentos. Esse esforço é o que ninguém normalmente fica sabendo. Você está descansando no conforto da sua cama, enquanto tem gente que defende você e está dormindo mal, apertado e longe da família. A profissão está longe de ser só glamour.

Acordei do "quarto de hora" por volta das 6h da manhã. Consegui dormir quase nada. Era muita gente entrando e saindo, não conseguia relaxar. E, quando acordei, fui lavar o rosto e escovar os dentes. Só que ambos os banheiros da UOP estavam ocupados. É muito raro isso acontecer. Achei estranho. Então decidi ir no banheiro dos usuários da via. É um banheiro fora da UOP que qualquer um que esteja passando pode usar. Fica sempre aberto e, na medida do possível, limpo. Depois fui tomar um café para aguardar a rendição. O plantão acabava 8h da manhã.

Descobri, conversando com os colegas, que muitos haviam passado mal por causa da comida do dia anterior (lembram que tinha ficado fora da geladeira?). Passaram a madrugada vomitando ou no banheiro! Comecei a me preocupar. Até então não tinha sentido nada.

A rendição, nesse dia, não seria na própria UOP, como era de costume, seria feita no início da BR, por motivos de logística. Normalmente os colegas vão até a UOP e nos rendem. Nesse dia nós iríamos encontrá-los com as viaturas ostensivas e eles chegariam para nos render com as viaturas veladas (que não são identificadas e nem pintadas nas cores da polícia), trocaríamos de viaturas, e cada um seguiria para seu destino: eles para a UOP e nós para a Superintendência na capital. Só que desse ponto da troca até a superintendência era mais 1h e meia de trajeto, dependendo ainda do trânsito. E esse tempo de trajeto começou a me preocupar, já que eu acabara de sentir uma pontada na altura do intestino que me avisava: chegue logo num banheiro!

Cutuquei o colega e falei: mermão, acelera aí senão vai dar merda. E o colega começou a rir. Eu falei: é sério, porra, tô suando frio aqui. Quem já teve dor de barriga de comida estragada sabe do que eu estou falando. Aí ele me olhou sério e perguntou: tá nesse nível? Eu falei: sim. Então ele pisou fundo. Mas lembrem que eu falei que seria pelo menos mais 1h30min? Pois é, não ia dar tempo.

A floresta começou a ficar atraente. Fiquei pensando, entre uma cólica e outra, se eu deveria pedir pra ele parar ali mesmo, pra eu correr pro mato. Nessa hora a minha camisa, mesmo no ar-condicionado, já estava encharcada de suor. Foi então que vi um posto de gasolina de beira de estrada. Eu conhecia o posto, trabalhava naquele trecho a algum tempo, mas não sabia as condições do banheiro deles. Mesmo assim pedi para o colega encostar. Ele parou perto de onde era o banheiro e fui lá ver.

Era pior do que você possa imaginar. O banheiro nem porta tinha. Por mais vontade que eu tivesse, minha dignidade não me deixava usar aquilo. Então resolvi recorrer ao gerente do posto. Perguntei dele se tinha banheiro, e ele me disse que era aquele lá atrás. Eu estava fardado, tive que recorrer, e falei: amigão, aquele banheiro nem tem porta, e isso é uma emergência policial. Ele percebeu meu desespero e falou: pede a chave dos frentistas.

Isso foi engraçado porque eu olhei pro frentista que estava longe e falei: irmão, a chave do banheiro, pode me emprestar. Acho que na minha cara estava estampado meu desespero, porque ele sacou a chave rapidamente do bolso e arremessou-a pra mim. Sucesso. Banheiro limpinho. Papel de emergência na mão. Mais uma operação bem sucedida, depois de alguns sacrifícios.

E descobri depois, conversando com os colegas, que uns 70% daqueles que trabalharam naquele dia foram abatidos por causa da comida servida. Depois desse dia aprendi. Nada me faz comer comida que ficou fora da geladeira aqui no nosso clima. Fico com fome, mas pelo menos com a dignidade íntegra.

ps.: Pessoal, comentem aí se vocês curtem essas histórias de bastidores.

pps.: Não esquecem de seguirem lá no Instagram: @apfdonorte

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pppps.: Se acharem algum erro, favor informar. Eu sou meu próprio editor. Ajudem aí, senhores.

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Cupom de desconto para o Projeto Missão Papa-Fox

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Finalmente um descontinho para o melhor projeto de simulados para carreiras policiais!

Pessoal, quem me acompanha no Instagram sabe que eu enchi o saco do pessoal no Projeto Missão Papa-Fox para ganhar um cupom de desconto para os leitores do blog e seguidores.

O Missão Papa-Fox foi um dos grandes responsáveis pela minha aprovação. Por meio dos simulados eu sabia exatamente onde precisava melhorar. E quando me perguntam por aqui ou pelo Insta o que eu recomendo para aumentarem as chances de serem aprovados, sempre respondo: Questões e simulados do missão papa-fox.

E, acho que por isso, eles finalmente liberaram um cupom de 15% de desconto. Na verdade eles liberaram faz 2 dias, eu comi mosca e só vi agora no e-mail.

Quero que fique bem claro que eu não estou recebendo absolutamente nada por isso, e nem é minha intenção. Sei que tem muita gente com a grana curta, espero conseguir ajudar o máximo de pessoas possível.

Quero agradecer de coração o pessoal do Projeto Missão, que faz um excelente trabalho mesmo.

Clique aqui para ir para a turma para qual o desconto vale!

Cupom: Pergunte-me do Instagram por direct. Tem que estar me seguindo (@apfdonorte) e seguindo o Projeto Missão (@projetosmissao), e marcar um amigo na postagem do Instagram. Marque quantos amigos você acha que tem interesse nesse desconto.

O cupom dá um desconto de 15%. O Valor da turma normal é R$ 150,00, com o cupom fica R$ 127.00.

Espero realmente que ajude.

domingo, 12 de julho de 2020

Quem tem cu tem medo

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A coragem e o medo.
Nas delegacias descentralizadas, que são aquelas que ficam nas nossas fronteiras, o trabalho do Agente de Polícia Federal é quase que um fazer de tudo um pouco. Diferentemente das Superintendências, que você normalmente fica lotado em uma delegacia específica, e só trabalha com aquele tipo de investigação. E, um dos serviços que fazíamos muito era a entrega de intimações. Só que o mais difícil dessa atividade nessas cidades pequenas do interior, não é a entrega da intimação propriamente dita, é saber onde entregar, e como chegar lá!

A cidade é habitada basicamente por pessoas de baixa ou baixíssima renda. Grande parte deles vivem do bolsa família. E muitos trocam de casa como verdadeiros nômades, isso quando não moram em um sítio longe, que só é possível chegar viajando horas pela estrada ou, até mesmo, navegando alguns dias de barco.

Por causa dessas características peculiares fica difícil achar o endereço atual, já que esse troca-troca de residência faz com que rapidamente os bancos de dados a que temos acesso fiquem desatualizados. E aí você parte para encontrar o telefone. Os números são trocados mais que mudas de roupas. Mas algumas vezes ainda é possível conseguir. Mas no caso de não achar endereços atualizados nem telefones e nenhum banco de dados, o jeito é sair perguntando dos ex vizinhos e parentes, para tentar fazer a localização da pessoa. 

E nós estávamos numa missão dessas: intimar uma pessoa que teria que dar esclarecimentos lá na delegacia. Não achamos porra nenhuma de endereços nem telefones, então partimos para rua. Depois de uma busca do capeta, perguntando daqui, procurando dali, fomos informados que a pessoa a ser intimada morava numa viela próxima ao rio. Só que nem era certeza ainda. Porque as pessoas nos informam assim: "fiquei sabendo que ela se mudou para o endereço X". E aí você vai no Google e procura o nome da possível rua até achar, isso quando sabem o nome de rua. A maioria das vezes nos informam por referência: "Ah, você que falar com fulano? Mora no entroncamento da padaria do Zé com a marmoraria do João, fica logo ao lado, conhece?" Como é cidade pequena, para nossa sorte, após apontada a direção da possível residência, acabamos achando a rua, e lá nesse novo endereço começa nosso perrengue novamente de perguntar e perguntar. Algumas vezes achamos, mas nem sempre.

E nessa incursão de procura e não acha que eu e um colega nos deparamos com uma situação complicada. Após passar a manhã toda buscando uma pessoa que deveria ser intimada, chegamos numas palafitas localizadas em cima de um mangue da cidade, na beira do rio. Aqui chamamos essas áreas de várzea, que é onde o rio alaga quando enche. Não tinha como entrar com a viatura, era muito estreita. E, o lugar era sabidamente uma área vermelha da cidade, por ser dominada por uma conhecida facção criminosa.

Na entrada da viela havia um moleque comento uma marmita, com todo jeito de ser um olheiro dessa facção, e duas meninas com características de usuário, sendo que uma usava uma tornozeleira do tipo que dão quando se sai da penitenciária. Não dá para esconder a profissão, e nem inventar história, mesmo estando à paisana, já que na cidade todos sabem que você é policial. E essas pessoas sentem o nosso cheiro. Perguntamos pelo nome de quem queríamos intimar. Falaram que não conheciam. A partir daí tínhamos duas opções: entrar no beco ou sair dali.

Enquanto nos olhavam, nos afastamos um pouco e conversamos entre nós se valia a pena entrar, e decidimos que não valia. Era um lugar apertado, sem rotas de fuga. Não havia para onde correr e nem onde se esconder caso aparecesse mais gente e quisessem nos emboscar. Não tem nenhuma justificativa você querer dar uma de herói para nada, muito menos para fazer uma mera intimação. Nem tínhamos certeza se era ali mesmo que quem procurávamos morava. Então achamos que seria a hora de nos recolhermos. Andamos um passo para trás, para depois andar dois para frente.

Não é vergonha sentir medo. O medo é aquilo que faz você ficar seguro. Eu não me lembro se achamos essa pessoa depois em outro endereço ou se simplesmente não encontramos, mas quis relatar aqui uma situação de perigo que achamos que não valia correr o risco, mesmo sendo policiais treinados. É impossível ganhar todas, o que não pode acontecer é deixar morrer.

ps.: Pessoal, não esqueçam de compartilhar se gostarem do texto.
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