Senhoras e senhoras, começarei esse texto avisando que eu não acho que todos os policiais militares são truculentos, mas existem membros em todas as forças policiais que são sim desnecessariamente truculentos e desproporcionais na hora de abordar qualquer pessoa. Esse foi o caso que aconteceu comigo, e que contarei a vocês.
Nos é ensinado na academia que o momento da abordagem é um momento crítico. Você não sabe quem está sendo abordado, e não está escrito na testa de ninguém se é ou não bandido. Então, no primeiro contato com os abordados, o policial deve ser mais enérgico e firme no que está fazendo, para caso haja qualquer reação, ele esteja pronto para agir sem perder tempo. É muito importante não acomodar e achar que ninguém vai reagir a uma abordagem policial. Temos vários exemplos de policiais mortos ou feridos nas mais diversas situações de abordagem pelo nosso país e pelo mundo.
A academia de Jiu-jitsu ficava a uns 500 metros da minha casa. Era uma academia de bairro, localizada em um conjunto de casa. Essa região era conhecida por assaltantes oportunistas, que são aqueles que não podem ver alguém vacilando na rua, que vão lá fazer seu corre, normalmente numa motocicleta e armados, para pegar um celular ou algum dinheiro. Por esse motivo eu preferia ir de carro, mesmo sendo muito próximo à minha residência.
Nesse dia, peguei meu kimono, entrei no carro e fui treinar, como fazia normalmente em todos os outros dias. Estacionei quase em frente a academia. Antes de descer do carro, olhei bem para os lados, atento para ver se não vinha nenhum desse oportunistas de moto me assaltar. Sai rapidamente, tranquei o veículo com o controle remoto e entrei na academia. Fiz a aula normalmente. Começava por volta das 19h30min e durava até 21h, alguns dias até 21h30min.
Quando eu sai da academia, notei que havia duas viaturas da Polícia Militar no começo da rua, uns 30 metros de onde eu tinha estacionado. Fiquei até mais tranquilo, já que com a presença da PM dificultaria a ação, naquele momento, de qualquer um que quisesse me fazer algum mal. Nesse dia eu daria carona para um amigo do jiu-jitsu, que também morava próximo, mas era perigoso para ele ir a pé, principalmente sozinho.
As roupas que estávamos vestindo era somente a calça do kimono. Ambos estávamos sem camisa, já que meu carro não tinha banco de couro, e o Uwagi (parte de cima do kimono) estava ensopado de suor, e também fazia muito calor. Estávamos no norte do Brasil, academia sem ar-condicionado e tivemos, como sempre, um treinamento intenso. Resultado disso: muito suor e calor. Estou contando os detalhes das vestimentas porque isso vai ser importante durante a abordagem.
Fui para o meu carro, que estava estacionado de ré em relação às viaturas. O meu amigo sentou no banco do carona. Eu, com preguiça de fazer a volta com o veículo, resolvi segui de ré pela rua, já que próximo de onde as viaturas estavam tinha um cruzamento, e seria muito mais fácil manobrar, já que a rua era bem estreita e tinha calçadas muito altas.
Quando eu estava quase chegando ao cruzamento, uma viatura se mexeu e encostou atrás do meu carro, impedindo que eu entrasse de ré no cruzamento. Pensei: porra, esse cara não viu que eu estava saindo da rua? Custava ele esperar um pouco até eu manobrar? Achando que a intenção dele era entrar na rua e vendo que a viatura não conseguiria passar, pois meu carro atrapalhava, já que tinha um carro estacionado ao lado, em paralelo ao meu, avancei um pouco, para dar passagem.
Foi quando ele encostou novamente atrás. E eu, na minha mais doce inocência, pensei: Caralho, esse cara é burro. Não viu que já dava pra passar! Então fui novamente um pouco para frente, ficando bem em frente a academia de jiu-jitsu, no mesmo lugar onde estava estacionado momentos antes. E novamente eles encostaram. Foi quando eu notei que tinha algo errado, e o carona falou: cara, acho que eles querem que a gente desça do carro.
Nesse momentos eu olhei pela janela do motorista, e vi quatro policiais apontando fuzis e pistolas para meu carro, gritando e xingando, para que eu descesse e colocasse as mãos para cima. Nessa época eu não era policial, e nem sequer já tinha atirado ou tinha qualquer intimidade com qualquer tipo de arma. Fiquei muito nervoso com a situação. Nervoso de medo.
Os caras gritavam: "desce filho da puta, desce com a mão na cabeça, seu filho da puta". Eu falei: "calma irmão, tô..." Quando fui interrompido: "cala a boca, seu merda. Cala a boca. Desce todo mundo."
Nessa hora estava eu e o colega já fora do carro, encostados no veículo com as mãos sobre o teto. As armas continuavam apontadas. Os dois PMs que não estavam de armas longas se aproximaram, um de mim e outro do colega, e começaram a nos revistas. Lembram como estávamos vestidos? Pois é, não tinha nem como escondermos qualquer tipo de arma. Mas até aí, tudo bem. Trabalho deles.
Nessa hora, como estávamos bem em frente a academia de jiu-jitsu, o mestre e os colegas de treino foram aparecendo e ficaram observando aquela abordagem. O mestre tentou falar que tínhamos acabado de sair do treino, quando foi interrompido com um cala boca.
Mandaram o carona ficar de frente para o muro, e me pediram para acompanhar a revista no veículo. Nessa hora eu falei que eles podiam baixar as armas, que não tínhamos armas e que não precisavam ficar nervosos, pois não éramos ameaça. Foi quando um deles retrucou gritando: "ninguém está nervoso aqui não". Eu falei: "eu estou, tem um monte de arma apontada para mim".
Voltando às técnicas de abordagem. Nós não representávamos mais ameaça. Eles podiam diminuir o grau de intensidade e de energia da abordagem. Poderiam parar de apontar as armas, nos deixando mais tranquilos. Você evolui a energia da abordagem de acordo com os abordados. É assim que é ensinado na academia. Acho que eles tinham esquecido.
Lembro ainda de o colega que estava encostado no muro virar para olhar o procedimento, quando foi repreendido, sem nenhuma necessidade, também com gritos: "encosta no mudo, filho da puta, não vira, põe a mão na cabeça!”. Cara, não tinha motivo nenhum de fazer isso, nós estávamos extremamente passivos e obedientes.
Nessa época eu já havia feito o concurso para perito da Polícia Civil do meu estado, e estava aguardando o resultado da prova. Mas pensava o tempo todo: como eu queria, naquele momento, já ser policial e poder me identificar para acabar com aquela abordagem desnecessariamente truculenta.
Então, quando o policial ia começar a revistar meu carro, um amigo do jiu-jitsu que estava assistindo àquilo tudo, e também era PM, chamou o chefe da guarnição, se identificou e falou que nós tínhamos acabado de sair do treino. Nessa hora o PM chefe me chamou e falou: agradece ao teu amigo ali, senão isso aqui ia ser muito pior.
Eu fico imaginando que pra ser pior que aquilo, só se eles nos batessem ou atirassem. Não entendi o motivo da abordagem tão truculenta até hoje. Para que eu teria ido em direção às viaturas se eu tivesse algo a temer? A rua tinha saída para o outro lado, caso eu quisesse fugir. Além de tudo, não me pediram nenhum documento, e todos eles estavam sem os nomes na farda.
Eu não fiquei traumatizado, mas fiquei bem aborrecido e um pouco triste. Remoí isso por algumas semanas. Acredito que não seja necessário esse tipo de atitude de nenhuma força policial. Abordar de forma firme sim, truculenta, jamais.
Comente aí se você já foi abordado assim por alguma força policial e qual foi sua reação!