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segunda-feira, 14 de setembro de 2020
Por que eu troquei a PRF pela PF
segunda-feira, 7 de setembro de 2020
Drogas no Aeroporto - Nunca Duvide!
Quando mudei de cidade no início do ano de 2020, saindo de uma delegacia descentralizada no interior para uma superintendência na capital, assim que cheguei já fui trabalhar no aeroporto da cidade, no setor de imigração. Nesse setor, a principal atividade, é atender os voos internacionais que chegam e que saem, fazendo a imigração de centenas de passageiros todo dia. O regime de trabalho é 24/72h, ou seja, trabalha 24h e folga 72h.
Mas, além de fazer a imigração, nós também atendemos aos chamados das companhias aéreas e dos funcionários do aeroporto para problemas com passageiros de voos domésticos que já estão do lado AR. O lado AR é aquela parte restrita do aeroporto, onde só podem entrar funcionários credenciados e passageiros que passaram pelo Raio X e detector de metais, o que inclui a sala de embarque dos passageiros.
Fiquei por cinco meses trabalhando no aeroporto e ganhando muita experiência. Mas todos que acompanham o blog aqui sabem que é muito comum eu me dar mal. E nada melhor do que você se dar mal para ganhar mais experiência ainda. E foi a minha falta de experiência que me fez cometer o erro que contarei para vocês abaixo:
Estava eu na salinha da PF, aproveitando para descansar num horário sem voos internacionais, quando tocou o telefone. Era um APAC (Agente de Proteção da Aviação Civil) - são aquelas pessoas que ficam normalmente no raio x dos aeroportos - me avisando que tinha uma mala suspeita no Raio X. Foi a primeira vez que me chamaram por esse motivo. Foi logo no primeiro mês de trabalho.
Como eu vinha de um interior que pegar droga no aeroporto era coisa rara, achei que não seria nada de mais. Fui ao Raio X e pedi para passarem a mala novamente. A imagem da máquina mostrava muitos tabletes de algo que parecia ser orgânico. Mas é muito comum, aqui na região norte, você abrir uma mala dessas e estar cheia de farinha, por exemplo. A farinha daqui é uma das melhores, e o pessoal leva para todos os cantos do Brasil. Achei que poderia ser isso.
E quem é policial sabe, você jamais abre a mala do passageiro sem estar na presença dele. Isso para não existir nenhuma dúvida de que alguém que não seja o próprio passageiro possa ter colocado algo dentro. Então mandei chamá-lo pelo rádio, na frequência da companhia aérea, para que ele fosse lá comigo. Dessa forma poderíamos abrir sua mala em sua presença. E fiquei aguardando, e esse foi meu erro. Mas fiz isso por não acreditar que poderia ser entorpecentes mesmo. Coisa de novato num aeroporto de grande porte.
Até que o funcionário da companhia aérea manda uma resposta pelo rádio: achamos o dono, estamos levando-o aí. Aguardei mais 1 minutos e o funcionário fala no rádio novamente: o passageiro está andando rápido para o estacionamento, disse que esqueceu algo no carro. Aí ficou suspeito demais. O cara ia viajar e esqueceu algo no carro? Então perguntamos: onde vocês estão? Ele demorou para explicar, o aeroporto é grande, e ele não explicava direito. Saímos procurando, mas nos desencontramos. E ele novamente se comunica, estamos no estacionamento do piso inferior, o passageiro saiu correndo.
Puta que pariu. Saí correndo pra encontrar o funcionário da companhia, que me disse apontando: lá vai ele. O cara já estava uns 200 metros de distância, e aumentando. Saí correndo atrás, nessas horas me arrependo de não ser um corredor. O vagaba sumiu na minha frente. Corri um quilômetro atrás dele, mas não alcancei. Estava quase morrendo já. Liguei para o colega pegar a viatura e ir me buscar. Se eu voltasse andando era capaz de ter um infarto. E olha que não sou gordo nem despreparado, mas o pique foi insano. A vontade de pegar o dono da mala era grande.
O colega me buscou, e resgatou uns APACs que tinham corrido junto comigo. Os caras foram parceiros, que esse nem é o trabalho deles. Conversando no percurso com algumas testemunhas, elas disseram que um homem com a descrição que demos pegou carona em uma moto. Acreditamos que era o comparsa que o aguardava fora do aeroporto caso desse algo errado.
Ao voltar para a sala do raio X, chamei algumas testemunhas, inclusive o colega da PF, e abrimos a mala. Eram uns 20 tabletes embalados a vácuo. Parecia muito com pacotes de café, só que não. Saquei o canivete tático e abri um para poder averiguar. Era skunk puro. O cheiro é inconfundível. Logo a sala toda ficou fedendo. Levamos a mala para a salinha da PF e começamos a tentar descobrir quem era esse cara que correu.
Todos, ao fazerem o check-in ou despachar mala, devem apresentar um documento. E a funcionária que o atendeu, por sorte, anotou o número do documento. Muitos no intuito de não serem descobertos usam documentos falsos, então esse documento poderia não significar nada. Mas, ao consultar os sistemas, achei uma foto. Mostrei essa foto para funcionários que o atenderam e bingo, ele foi reconhecido. Ele não foi preso em flagrante, mas será preso depois. Essa galera não para e uma hora a gente pega.
E foi assim que eu aprendi que não se deve pedir para o passageiro ir até você. Você vai lá e traz ele pelo braço. Eles normalmente não correm quando é um policial que está no seu encalço. E o meu erro foi ter deixado um funcionário da companhia aérea conduzir um suspeito de tráfico de drogas.
Depois desse dia, durante esses meses trabalhando no aeroporto, eu recebi vários chamados iguais. Quase todo plantão tinha uma ocorrência dessas. E agora eu ia com sangue nos olhos. Ninguém mais correu. Sempre eu ia buscar os passageiros lá dentro da sala de embarque. Trazia eles bem quietinhos até sua mala, abria a mala na presença deles, exatamente como manda o figurino. Acostumei a ver suas caras fingindo espanto e dizendo que não sabiam que aquela droga estava ali dentro, depois suas caras de tristeza e choro por terem sido pegos.
E esse foi um dos meus aprendizados. Na polícia nós temos um ditado que diz: Só a dor gera compreensão. Claro que isso não é 100% verdade, mas que a dor ajuda na compreensão, com certeza ajuda.
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